Além do Cidadão Kane

domingo, 10 de maio de 2009

Afeganistão: o imperialismo se prepara para uma revolução

Obama foi eleito com a promessa de retirar o mais rápido possível as tropas do Iraque e concentrar a guerra no Afeganistão. Nem uma coisa, nem outra foi feita. O imperialismo anuncia uma nova estratégia militar para disfarçar uma derrota colossal na região

Os EUA já foram derrotados no Afeganistão. A prioridade agora é impedir que o inevitável retorno do Talibã ao poder derrube também o governo no país vizinho, o Paquistão, e abra um período catastrófico de novos ataques terroristas na Europa e nos EUA.

Em uma entrevista de mais de uma hora para o programa 60 Minutes, veiculado pelo canal CBS, pela primeira vez desde que o Afeganistão foi ocupado em 2001, Barack Obama anunciou uma perspectiva de saída das tropas norte-americanas e uma estratégia oposta a de seu predecessor, George W. Bush. Segundo suas palavras, os EUA não pretendem mais "exportar a democracia, o bom governo e os princípios básicos de uma sociedade civil", pois já está na conta do presidente e das Forças Armadas dos EUA a volta do Talibã ao poder e a derrubada do governo afegão.

A prioridade agora é firmar um plano para impedir que o Paquistão caia nas mãos do Talibã e da Al-Qaeda e garantir que estes grupos não ataquem os EUA e nenhum de seus aliados.

Obama disse que a nova estratégia que desenha para o Afeganistão prevê o final da guerra em um futuro próximo. O presidente da maior potência do mundo e ao mesmo tempo um dos países mais vulneráveis disse que o Afeganistão é uma das maiores prioridades de seu governo e que a solução para este país - e para os EUA - não é só militar, mas "político e social".

"O que não podemos pensar é que só um enfoque militar resolverá nossos problemas no Afeganistão. Temos que ter uma estratégia de saída. Temos que criar uma sensação de que não estamos à deriva" (Reuters, 23/3/2009).

Em três meses de governo, Obama já enviou 17 mil soldados para somar-se aos 36 mil efetivos instalados no país asiático. A prioridade não é combater a insurgência, mas proteger o governo de um golpe de Estado e fortalecer a fronteira com o Paquistão, região onde o Talibã se reconstituiu após ser derrubado em novembro de 2001.

No mesmo sentido, o representante especial dos EUA para o Afeganistão e o Paquistão, Richard Holbrooke, defendeu na OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) a necessidade de se estabelecer "uma estratégia conjunta com ambos países para resolver a situação em um, Afeganistão, e evitar a deterioração de gravíssimas conseqüências, no outro, um Paquistão com armas nucleares e minado pelo extremismo".

"Não pode haver êxito no Afeganistão se não mudar a situação no Oeste do Paquistão", região controlada pela insurgência islâmica e reduto dos talibãs (The New York Times, 24/3/2009).

Uma derrota devastadora

Segundo um porta-voz do Talibã, "os EUA vão ser derrotados tal como os soviéticos no Afeganistão".

"Cada dia mudam o discurso para dissimular a sua derrota. Eles querem enviar para o Afeganistão o mesmo número de tropas que os soviéticos nos anos 80", disse Yousuf Ahmadi, em uma declaração concedida por telefone para a AFP.

As tropas soviéticas iniciaram uma invasão do Afeganistão em dezembro de 1979, permanecendo no país pelos dez anos seguintes sem nenhuma vitória contra a insurgência apesar das tropas somarem mais de 160 mil soldados.

É unânime entre os oficiais militares o sentimento de derrota. Em novembro do ano passado, o comandante das Forças Especiais Britânicas (SAS, em inglês) no Afeganistão, Sebastian Morley, renunciou ao cargo diante da completa ausência de segurança para seus soldados.

Em fevereiro do ano passado, o secretário de Defesa dos EUA, Robert Gates, já havia declarado que a OTAN está se tornando uma aliança de duas vias, na qual uns países estão mais dispostos que outros em assumir riscos no Afeganistão.

“Eu me preocupo muito com a possibilidade de a aliança evoluir para uma aliança com dois níveis, na qual você tem aliados que estão dispostos a lutar e morrer pela segurança das pessoas e outros que não” (BBC, 7/2/2008).

Agora, nem mesmo o presidente dos EUA está disposta a assumir este risco.

Após quase oito anos de ocupação, praticamente recuperou todo seu poder perdido para as forças de coalizão. Segundo um artigo publicado em dezembro do ano passado no Wall Street Journal, "os talibãs estão estabelecendo tribunais e instituições locais em todo o Sul do Afeganistão". Hoje, o grupo já domina mais de 70% de todo o território nacional, restando apenas a capital e seus arredores.

Os talibãs impuseram seu próprio governo em mais da metade do país, nomeando seus próprios governadores e prefeitos que cuidam da administração desde às zonas mais remotas até regiões próximas à capital. Há cerca de dois anos, membros do Exército norte-americano já haviam alertado sobre a degradação da ocupação estrangeira, afirmando que não se tratava de como as tropas combateriam a insurgência, mas quando ela chegaria à capital.

O governo paralelo estabelecido pelo Talibã, adquiriu uma enorme autoridade diante da população, pois é o principal grupo que combate às forças de ocupação.

As tropas norte-americanas estão à beira de serem escorraçadas. A situação não poderia ser pior. Somada ao colapso econômico mundial, os EUA não têm mais condições de gastar tanto dinheiro para uma guerra que, junto a do Iraque, acumula mais de US$ 1 trilhão para nada.
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Original em PCO

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