Além do Cidadão Kane

sábado, 13 de junho de 2009

Guerra dos EUA no Paquistão provoca enorme crise de refugiados

“Mais de 2 milhões de pessoas foram forçadas a abandonar os seus lares quando o exército paquistanês, financiado e equipado pelo Pentágono, entrou no Vale Swat após uma semana de intensos bombardeios com aviões de guerra e helicópteros equipados com metralhadoras”. É a tentativa de impor a Pax Imperial dos EUA
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Deirdre Griswold*
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Não há nenhuma dúvida: a terrível crise humanitária que neste momento está a ocorrer na área do Nordeste do Paquistão, fronteiriça com o Afeganistão e descrita pelo Alto Comissariado para os Refugiados da ONU (UNCHCR, siglas em inglês) como a pior crise de refugiados desde a crise no Ruanda em 1994, foi causada diretamente pelo governo dos Estados Unidos e pelo Pentágono.
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Mais de 2 milhões de pessoas foram forçadas a abandonar os seus lares quando o exército paquistanês, financiado e equipado pelo Pentágono, entrou no Vale Swat após uma semana de intensos bombardeios com aviões de guerra e helicópteros equipados com metralhadoras.
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A UNCHCR disse que quase um milhão e meio de pessoas se registaram para receber assistência desde que a luta começou, elevando o número de deslocados na província fronteira noroeste para mais de 2 milhões, sem incluir os 300.000 que o governo provincial crê que não se registaram (The Guardian/UK, 19 de Março). Grande parte da população na área está em sofrimento. «Segundo os relatos da ONU, somente 130.000 pessoas estão acomodadas nos campos dos distritos de Mardan e Swabi, enquanto que a maioria está sendo forçada a alojar-se com amigos e parentes, até 85 pessoas numa casa», continua a relatar o Guardian.
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Não há uma contagem dos mortos nem dos feridos. Não se permite á imprensa entrar na área.
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Washington exigia esta ofensiva há muitos anos. Ainda o General Pervez Musharraf era o ditador «eleito» do Paquistão, já artigos no New York Times e no Washington Post expressavam as frustrações da política exterior dos Estados Unidos e dos militares pela sua hesitação em se movimentar contra estas regiões semi-autónomas ao largo da fronteira.
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Musharraf teve que entregar o seu posto quando, há um ano, um movimento popular massivo colocou o partido da oposição na liderança, e a sua candidata presidencial, Benazir Bhutto, foi assassinada depois do seu regresso do exílio. O seu lugar foi ocupado pelo marido, Asif Ali Zardari.
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Zardari, agora presidente do Paquistão, cedeu á tremenda pressão de Washington e lançou a ofensiva contra as áreas que os Estados Unidos afirmam estar controladas pelos Talibans, um grupo político-religioso que os Estados Unidos apoiavam até há pouco, quando queriam derrubar o governo progressista do Afeganistão, que estava próximo da União Soviética.
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Uma abominável mudança de comando
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Ao mesmo tempo, o Secretário da Defesa dos Estados Unidos Robert Gates, substituiu o comandante no Afeganistão, General David McKiernan, pelo Tenente General Staley McChrystal. McKiernan era mau. Parece que McChrystal será ainda pior para as gentes desse país.
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O currículum de McChrystal inclui anos no cargo de Comando de Operações Especiais Conjuntas, efetivos “special ops”, que são treinados para ignorar as leis convencionais da guerra e foram descritos como tipos que “cortam pescoços e comem serpentes”. Por outras palavras, são os especialistas na forma mais depravada de matar.
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A administração Obama está também enviando mais alguns milhares de tropas dos Estados Unidos para o Afeganistão, apesar do óbvio mandato que recebeu do povo para acabar com as guerras, ali e no Iraque, e trazer as tropas para casa.
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Todo este sangue derramado e as ameaças não podem apagar o fato de a guerra dos Estados Unidos no Afeganistão estar num profundo aperto. Admite-se nos meios de comunicação ocidentais, cada vez mais abertamente, que a população está claramente contra a guerra e a ocupação. Os protestos ocorrem com regularidade, especialmente quando mais uma pequena povoação foi bombardeada e dezenas de pessoas são incineradas ou despedaçadas por bombas dos EUA.
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Á sua maneira típica, os imperialistas intensificam a guerra para a tentar alterar. Despoletaram uma cadeia inteira de circunstâncias no Paquistão, esperando forçar uma confrontação entre muçulmanos militantes contra os que desejam um país secular. Estão também a contar em usar o exército paquistanês contra o povo, tal como fizeram anteriormente, com êxito, com uma larga série de ditadores militares sustentados pelos EUA.
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O império britânico foi construído apoiando-se na estratégia de dividir para conquistar. Seria útil aos falcões do Pentágono recordarem o que se passou com os britânicos quando tentaram conquistar o Afeganistão em outra ocasião, nos anos 1890.
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Os britânicos destruíram mas não conquistaram
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Apesar da sua política de terra queimada e do emprego de soldados mercenários da Índia, os britânicos não puderam conquistar Malakand, a mesma região que agora está sendo bombardeada, na sua campanha de 1897 contra o povo pashtu. O próprio Winston Churchill participou nessa campanha e escreveu um livro vilmente racista sobre o tema.
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Os britânicos possuíam metralhadoras e puderam massacrar os heróicos defensores pashtus, mas nunca os puderam conquistar.
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Hoje, o diretor da região Ásia-Pacifico da Amnistia Internacional, Sam Zarifi, afirmou que o exército paquistanês «parece que está prosseguindo uma política de terra queimada» em Malakand. O exército impôs uma política de «disparar contra tudo o que mexa», contra qualquer pessoa que viole o toque de recolher indefinido que se impôs. (Washington Post, de 14 de Maio)
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Mas o espírito de resistência á dominação imperial/colonial que derrotou os britânicos em 1897 continua forte no Vale Swat e na região inteira da Fronteira Noroeste. As atrocidades mais recentes irão marcar mais profundamente o coração das gerações futuras.
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* Deirdre Griswold é membro do Workers World Party e foi candidato à Presidência da República dos EUA em 1980.
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Tradução de Guilherme Coelho
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Publicado em O Diário.info

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